“A partir de hoje,
vocês está sob o olhar atento da Sociedade das Sombras e ao ingressar pelo
mundo oculto na escuridão, terá privilégios que só o saber pode dar a alguém,
como deveres que tal conhecimento te trará. Cuidado a quem revele o segredo dos
seres nas sombras, pois não vai gostar de receber uma visita de um dos nossos
membros.” - Sociedade das Sombras
A proposta desta
coletânea, segundo estas palavras na contracapa do livro, é apresentar ao
leitor histórias acerca de uma camada mais discreta da realidade, algo que só
vislumbramos às vezes com os cantos dos olhos, – será que o vulto que vimos era uma aparição? – mas que quando
conseguimos comtemplar em sua totalidade nos traz tormenta, maldição, mau
agouro. São relatos de quem teve contato com este nível tétrico da existência e
nunca mais foram os mesmos, perseguidos, mortos, levados para algo pior que a
própria morte. Os estilos de escrita são os mais diversos. Agora vamos aos
contos...
“—Eles são demônios famintos. Violam os túmulos e se alimentam de
carcaças humanas. Portanto, prometes-me que zelarás pelo meu túmulo. Não deixes
que eles se aproximem.” Pág. 15.
Acompanhamos Lucbarr,
um jovem que reside sozinho em uma grande propriedade no vilarejo de Shairaff. Ele
é neto de uma senhora, deveras supersticiosa, que faleceu com idade avançada e
que por meio de um sonho se faz presente para o jovem e com medo em seus olhos
sem vida implora para que ele proteja o seu local de descanso eterno contra uma
ameaça que paira sobre o cemitério de Reggor. Há duzentos anos uma grande onda
de morte passou pelo vilarejo de Reggor, ceifando centenas de vidas, e fez com
que os sobreviventes abandonassem o lugar. Lucbarr sofre de tafofobia, o que
proporciona um ar mais pesado ao enredo. A história não é dotada de grandes
mistérios, tudo fica exposto para quem souber olhar, mas a narração é de uma
lapidação espetacular, o que nos acorrenta a este quadro cujos moldes parecem
pautados em um estilo semelhante ao de Poe.
O misterioso caso de
Ashfield (Adriana Rodrigues)
Em uma Inglaterra com
traços clássicos de Sherlock Holmes em simbiose com o horror Lovecraftiano, em
que as criaturas habitam muito perto de nós, escondidos, alguns escravizados
por nossos governantes que visam evitar um pânico coletivo. É nesse contexto em
que Watson, um médico inexperiente na época da narração, recebe um convite de
um amigo, Rick Shadow, para visitá-lo. Ao chegar é pedido seus pareceres acerca
de um caso que se prova mais complexo do que parece e desemboca numa conclusão
imprevisível. Um conto que em pouquíssimas páginas nos faz querer mais.
Tratado imortal
(Adriano Siqueira)
Um vampiro, senhor do
reino de Valaska, visita o reino de uma bruxa, irmã de sua falecida amada, para
tratar de assuntos políticos e carrega também outro interesse. O cenário parece
uma mescla entre o medieval com as tecnologias do vapor, representado na
carruagem que transporta o morto-vivo. O estilo romântico-gótico aliado às
possibilidades do mundo do vapor me deixou com um gosto amargo de saudade na
boca. Só gostaria que o impacto social/econômico do vapor fosse mais explicado
nesse conto.
Barbara está morta
(Celly Borges)
Ruas imundas que são as
manifestações do espirito de seus habitantes, tanto aqueles que são banais,
aqueles que vemos sob a luz da lua, quanto os mais excêntricos, os que se
sentem mais confortáveis nas sombras, os filhos soturnos dos pesadelos mortais.
Mas serão os monstros mais terríveis do que os humanos corrompidos e
corruptores de seus iguais? Será que os males envoltos pelas trevas não são
preferíveis à companhia dos vermes rastejantes que se trajam com vestes há
muito maculadas e que às vezes glorificam seus supostos status divino? São os
pensamento que vão rondar àqueles que lerem este conto. Acompanhe os passos de
Barbara nesta narração de beleza poética escrita com grande talento.
Qual adversário mais
impiedoso, irrefreável e poderoso podem enfrentar os humanos – como disse
Tolkien, fadados ao eterno sono - que
não seja o tempo? Você gostaria de saber quanto tempo de vida lhe resta? Qual o
peso que a nossa ignorância do devir possui em nossas decisões? Medos e anseios
tão familiares deixam o horror destas páginas tangível.
A escolha (Nazarethe
Fonseca)
Uma jovem com dezoito
anos de idade opta por dar fim à própria vida após uma decepção amorosa,
contudo um encontro inusitado causa uma revolução em sua perspectiva. A
oportunidade de presenciar um prisma precioso da existência a faz questionar o
limite de nossa liberdade e a natureza qualitativa da vida. É uma história que
constrói uma argumentação valiosa: compreender a morte nos permite aproveitar
mais a vida.
O inferno pode esperar
(Carla Ribeiro)
Um anjo caído com uma
missão clara e inegociável interfere no rumo de algo para o qual sequer deveria
ter dedicado muita atenção, uma vez que não era algo de sua alçada, todavia um
único olhar foi mais do que suficiente para jogá-lo em uma punição. Tudo é
contado belamente. Mostra como um capricho pode ser tão fatal.
O regresso (Fábio
Ventura)
Viverem isolados de
toda a balbúrdia e efemeridade da civilização, eis o desejo de um casal de
apaixonados. Entretanto uma mensagem inesperada os separa. A mulher, conforme
os dias vão passando, se sente cada vez mais solitária e se pega cada vez mais
sonhando com o retorno de seu amado. Em um dia tão repentino quanto a sua
partida o homem regressa, porém completamente modificado, com um jeito
demoníaco. Esta é uma metáfora sobre como o espirito humano se molda de acordo
com suas experiências.
Monstro (Kampos)
A vontade de vingança
de um camponês contra o rei tirano que ordenou a sua execução o faz aceitar a
proposta de um ser misterioso sem pensar duas vezes. O final é surpreendente e
o jeito maquiavélico daquele que ajuda o prisioneiro é também expressão de um
refinado humor negro.
Férias encantadas
(Louise Cardoso)
“O
que você faria se de repente descobrisse que possui poderes mágicos e está
destinada a salvar o mundo de forças maléficas?” Pág. 121.
Admito que essa ideia
na qual a trama tenta se alicerçar me fez torcer o nariz, não por um
pré-julgamento e sim pela saturação do tema explorado em tantas histórias até a
exaustão nos últimos anos. Estas palavras de abertura do conto no mínimo deixa
subentendido que na trama seremos testemunhas de um embate de forças
antagônicas de grande poder, uma vez que para dominar o mundo, sem dúvida
alguma, é necessário um alto nível de poder. Contudo o que vemos são
personagens superficiais, inseridos na trama e mal apresentados, sem
antecedentes suficientes ou descrições físicas para lhes conferir profundidade.
A história não possui pontos altos e quando achamos que teremos uma cena boa
tudo acaba rapidamente. O conto ainda termina em um momento que deixa o enredo
mal amarrado. Meu único conselho para a autora seria que reescrevesse o conto,
dando mais profundidade aos personagens (descrições físicas e peculiaridades de
personalidade).
A vida oculta (Kane
Ryu)
Dois irmãos gêmeos,
sendo uma mulher e um homem, criados pela mãe que se separou há alguns anos do
pai deles, acabam de completa 21 anos e na sexta-feira seguinte ao aniversário
a mãe, que alega precisar fazer uma viagem de negócios, diz para eles não
saírem à noite, mas contrariam a ordem e segredos familiares são revelados. Um
conto que mostra que até mesmo os tipos mais improváveis possuem uma família e
será que toda família também não possui os seus segredos?
Urbanos (Gabriel Arruda
Burani)
Uma garota com uma
personalidade completamente urbana, com uma casa grande e luxuosa e formação educacional nas melhores escolas particulares, descobre que possui um dom e
procurando respostas percebe que mesmo na selva de pedras a magia persiste. O
conto fala sobre a fraqueza da magia (entenda-se inteligência imaginativa) na
nossa sociedade tão técnica e a falta de propósito na correria do dia a dia.
Espectro (Bruno
Pereira)
Todo bom pai de família
almeja conseguir uma boa moradia onde seu casamento possa prosperar e a criação
de seus filhos seja a melhor possível. Mas como agir quando algo parece não se
encaixar nesse quebra-cabeça? O desfecho é de deixar o queixo caído e o
suspense é bem desenvolvido.
Entra a caça e os
caçadores (Viviane Fair)
Uma caçadora de
vampiros que mantém uma relação de amor e ódio com seu arqui-inimigo que é um
vampiro representante da linhagem atualmente em moda, sedutor, metrossexual,
jovial. O texto é entediante, ao menos se você não for uma adolescente que
sonha com príncipes encantados dotados de corpos perfeitos e que a cada segundo
exalte a sua beleza até o ponto desse gesto se tornar um fastio. O vampiro com
jeitão canalha não convence para leitores que já provaram de clássicos como
“Drácula” e “Entrevista com o vampiro” e a caçadora, com 29 anos de idade, mais
parece uma adolescentes com os hormônios em pleno furor. Com tantas coisas que
poderiam ser descritas, enriquecendo o enredo, a autora prefere gastar tempo
cobrindo o vampiro de elogios. Um texto muito cansativo.
A coletânea realmente é
muito boa, a minha única observação de ponto negativo é a escolha do conto para
fechar o livro, acho que em meio a tantas pérolas “Entra a caça e os caçadores”
poderia ter uma melhor posição no inicio ao invés de no término. Estou
habituado com livros que aceleram conforme suas páginas avançam e esse último conto
foi uma freada muito brusca. Mais uma vez obviamente devo elogiar o trabalho
brilhante de diagramação e a arte na capa e ao longo das páginas do livro. A
estronho mais uma vez me proporcionou uma excepcional viagem pelas letras!
Recomendo este livro!
Uma antologia com uma ótima idéia: contos sombrios sobrenaturais. São os meus preferidos! Os que mais gostei foram: Bárbara está morta, A sala das ampulhetas e A Escolha. Infelizmente, não gostei de 3 contos. Na minha opinião, eles não se encaixaram na idéia da antologia. Férias Encantadas por exemplo, ficaria muito bom é um livro infantil. É muito simples, não tem profundidade nem na história e nem nos personagens. A autora usou mtos clichês e não soube trabalhá-los. A Vida Oculta e Entre a caça e os caçadores são bem adolescentes. São contos em que a personagem literalmente baba por um personagem o que eu não gosto. Gosto de romance, mas os contos são muito água com açucar. Claro que há quem goste, mas eles não se encaixam em nada na antologia. Não senti nenhum "que" de sombrio nesses três contos.
ResponderExcluirTirando isso, os outros contos são maravilhosos. Alguns me surpreendi pq não esperava tanto. Parabéns aos autores =)