Imagino se houve tempestade igual a esta.
Ando em meio à multidão, com seus guarda-chuvas negros, capas de chuvas
transparentes. Uma criança em uma capa de chuva de um azul claro pula em
uma poça e a água espirra em minha calça. A mãe puxa o menino nervosa e
por um segundo a criança olha nos meus olhos, porém é algo muito
rápido. Ela logo segue de mão dada com a mãe.
Ninguém olha diretamente para mim. Ninguém realmente me vê.
Acho que o cachorro me vê. Ele está me seguindo há muito tempo.
Falando nisso, quanto tempo estou andando? O que eu procuro? A realidade? Um sentido para tudo?
Olho para baixo, para minhas roupas encharcadas. Os meus pulsos estão
abertos e posso ver minhas veias de um azul meio roxo, porém é estranho.
Não sinto dor. A dor foi embora e não sei se isso é uma coisa boa.
Então me recordo brutalmente do que procuro. Ela.
Estou diante do edifício onde ela mora. Subo as escadas me sentindo eufórico.
Bato. Ninguém atende, mas ouço o barulho do chuveiro, então entro no apartamento.
Caminho lentamente em direção ao
banheiro, passando pelo quarto com roupas espalhadas, assim como
embalagens de comidas que não são muito saudáveis. Fico preocupado.
Recordo então que não posso me aproximar, que ela não pode me ver.
Saio do apartamento e desço as escadas. O cachorro me aguarda.
Abro devagar a porta, esperando que ela me veja e sorria, mas ela não me vê. Não olha para mim. Ela está chorando.
Sinto-me devastado com aquela cena. Ela, nua, embaixo do chuveiro
quente, que no momento exala um vapor dançando sobre as nossas cabeças.
Ela, com a cabeça na parede, as lágrimas se confundindo com a água do
banho.
Aproximo-me para que ela possa me ver, para que se acalme e eu possa dizer que está tudo bem.
Mas há algo sobre a pia que me faz estacar. Uma foto, uma foto de nós dois. Está um tanto amassada e manchada, como se tivesse sido deixada nas mãos de uma criança.
Mas há algo sobre a pia que me faz estacar. Uma foto, uma foto de nós dois. Está um tanto amassada e manchada, como se tivesse sido deixada nas mãos de uma criança.
Então escrevo algumas palavras no espelho. No vapor que continua a sair
da água quente. Escrevo querendo que minhas palavras passem a mensagem
de que ora, o que está feito, está feito. Siga em frente. Há muito que
ainda deve ser feito. Espero profundamente que ela entenda e não chore
mais por mim.
Sinto uma dor no peito tão forte, tão real. Então afinal, ainda posso sentir dor.
Sento no passeio, ao lado de uma
caçamba de lixo e choro. Choro em meio às pessoas que passam sem olhar
para mim. O cachorro está ao meu lado e a chuva dá a impressão de que
ele também chora.
Sinto-me arrependido. Pensei que não sentiria isso, mas sinto. Mas na
hora pareceu tão certo. A única coisa que me libertaria do homem fraco
que me tornei. Tão fraco... tão derrotado.
Em meio à chuva, em meio as pessoas, enquanto choro e o animal chora ao meu lado, repito as palavras que escrevi no espelho:
— Por favor, me perdoe.
Baseado em Low Man's Lyric - Metallica
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