segunda-feira, 2 de julho de 2012

Resenha + Entrevista: Danação



Esse ano certamente será de literatura nacional. Um ano que descobri ótimos autores do nosso país. Entre eles está o Marcus Achiles, autor de Danação.

Devorei as páginas de Danação. A história, de suspense, meu gênero favorito, tem o poder de lhe transportar para um Brasil colonial, onde os detalhes do dia-a-dia dos escravos, donos de fazenda e comerciantes são riquíssimos. Detalhes que sozinhos parecem sem sentido, mas com a história e narrativa do Marcus, torna tudo mais interessante.

O protagonista de Danação é Diogo. O conhecemos como um andarilho, viajando sem rumo pelo sertão acompanhado de seu escravo João e o filho deste, Inácio. Há outro membro dessa tropa, mas ele só é visível para Diogo.

A criança de dentes pretos. Ou, se você preferir, o Diabo.

Ele é o motivo da peregrinação de Diogo. Acontece que em um momento de desespero, vendo sua família indo à falência, ele procura fazer um pacto para receber uma das maiores minas das Geraes. Só que, além da alma, Diogo acaba perdendo algo que considera mais importante: seu filho. Considerando a mina suja com o sangue de seu filho, Tiago, ele decide não usufruí-la e o Diabo o segue para lhe lembrar que embora ele escolheu descartar a sua parte do pacto, ele não descartou a dele.

As partes em que a criança dos dentes pretos está presente são as melhores do livro. Como as pessoas reagem quando ela está por perto, podendo vê-la ou não, dá aquele ar de suspense que me agrada bastante.

Diogo durante a sua caminhada, recebe um sinal que considera de Tiago, que o leva a Taubaté. A vila no momento está sendo evitada. Durante cinco semanas, corpos foram encontrados carbonizados toda sexta-feira. Diogo acaba tendo que enfrentar o autor dos assassinatos, que não são os bugres como pensam todos na vila, mas alguém tão amaldiçoado como ele.

Fogo. Sexta-feira. Se você conhecer o nosso folclore, sabe de quem estou falando.

O que eu gostei no livro, o que me prendeu e me transformou em uma fã é que os assassinatos de Taubaté não são totalmente o foco da história. Tudo é interessante. Diogo com sua sina, a vida do seu escravo João, os costumes, crendices e é claro, a presença do nosso folclore.

A notícia que esse não será o único livro – veja na entrevista – me deixou ainda mais feliz.

Se você sempre pensou que o nosso folclore daria um ótimo livro de suspense, esse livro é Danação. Mais um exemplo de ótima literatura nacional.

Ficha Técnica:
Editora: Baraúna
Autor: Marcus Achiles
Origem: Brasileira
Ano: 2011
ISBN: 978-85-7923-487-3
Número de páginas: 409

ENTREVISTA COM O AUTOR

Essa entrevista nos traz curiosidades e novidades com relação ao Danação. Espero que gostem!



1 – Como surgiu a idéia para escrever Danação?
A ideia surgiu em 2007 quando fazia uma pesquisa escolar sobre folclore com meu filho e me deparei com a ilustração de um ser fantástico. Pensei: "Por que será que eu nunca vi nada sobre isso nas livrarias?" Não posso falar mais pois a criatura em questão está no livro, e não quero estragar tudo com um spolier... Nunca me conformei com a pouca atenção damos ao nosso folclore. Até gosto de vampiros, lobisomens, elfos, mas não vejo motivo para ignorarmos nossas próprias lendas. Não arrisco a dizer que chegou o ponto de saturação para vampiros & cia (se os livros continuam a ser publicados, é por que ainda existe mercado para eles), mas escritores e leitores deveriam ousar mais. Acho que uma boa mula-sem-cabeça, um boitatá, um mapinguari não deve nada a mito algum, de qualquer época ou região. Também sempre senti falta de romances históricos, ambientados séculos atrás. Exploramos isso muito pouco, o que é uma pena. E decidi escrever um livro que tivesse um pé no folclore brasileiro e outro no nosso passado.

2 – Completando a pergunta anterior, algum autor ou situação influenciou na escrita?
Li muitos livros de suspense ainda adolescente: Agatha Christie, Simenon, Alan Poe; Também alguma coisa de terror: contos de Stephen King (os contos são muito melhores que os romances), Lovecraft, Clive Barker. E Philip K. Dick na ficção científica. Mas influência de estilo eu acabei tirando de leituras que fiz já adulto, como Érico Veríssimo. Ninguém conta uma saga como ele. Ninguém. E o Naturalismo, com suas descrições cruas.

3 – O livro termina como se a história continuasse. Você planeja escrever um segundo livro?
Danação é parte de um projeto maior, que pretende passear pela então colônia, fazendo com que Diogo (o protagonista) se depare com seres do nosso folclore a cada livro. A idéia é que essa saga tenha quatro ou cinco livros. Cada região tem sua mitologia própria, que é única e instigante. Além disso, Danação traz o início do resgate da alma de Diogo. Tem de ler para conferir.

4 – Você recebeu muita influência na infância para a leitura? Gosta de ler que tipo de livros?
Como disse, sempre li muito quando era mais novo, mas por ironia nunca me considerei influenciado por outros escritores fantásticos. Já adulto reli muitos livros que tinha lido na adolescência e, somente então, fui valorizá-los. É o caso, por exemplo, de Aluísio Azevedo, que acho o melhor escritor brasileiro, e Érico Veríssimo. Atualmente, estou lendo as Crônicas de Gelo e Fogo, do George Martin, que são uma saga sensacional. Um dia alguém escreveu que os livros de George Martin são como O Senhor dos Anéis, só que mais amadurecido, uma leitura de fantasia, fugindo da abordagem infantil. Acho que isso me atraiu para essa série. Gosto disso, e não por coincidência considero Danação um romance de "folclore para maiores". Mas que também pode agradar os mais jovens.

5 – Quando descobriu que gostaria de ser escritor? Alguma dica para quem quer seguir o mesmo caminho?
Descobri que queria ser escritor quando percebi que quem pretendesse ler uma estória de fantasia ambientada no Brasil teria poucas opções. Aí comecei a pensar no Danação. Sobre as dicas, acho que nunca é demais fazer algumas sugestões: 1) leia muito. Não obrigatoriamente tudo, mas o maior número possível de livros. Se forem de estilos variados, melhor ainda; 2) domine a língua portuguesa. Não tem como fugir disso. Se o livro que estiver escrevendo se passar nos dias de hoje, use as gírias que achar necessárias nos diálogos ou na narração na primeira pessoa se for o caso, mas dominar a gramática, saber pontuar, ter variedade de vocábulos, sempre vai fazer diferença. 3) escreva sempre. Mesmo que seja um parágrafo num dia. E sempre releia o que escreveu, aprimorando um pouquinho de cada vez; 4) seja original. Não repita o que está aí. 5) Não amarre sua criatividade. Para quem escreve, principalmente alguma realidade alternativa como fantasia, não pode haver limites para a criação.

6 – Achei o livro riquíssimo em detalhes do dia-a-dia e costumes de um Brasil colonial. Como foi a pesquisa para escrever Danação?
Sobre a ambientação, o que me interessava não era a história factual, dos eventos, das datas, dos grandes personagens, mas sim a história das pessoas comuns. Como elas viviam, como moravam, o que comiam. Existe uma boa literatura sobre o tema, livros e periódicos que retratam usos e costumes nos séculos passados, além de tudo mais que pudesse ajudar a compor o cenário. Artigos publicados em revistas especializadas sobre saúde, alimentação, vestuário, justiça, o dia-a-dia nas pequenas vilas coloniais foram uma boa fonte. Mas essas informações são jogadas no livro de maneira incidental. Não existe nota de rodapé com explicações, glossário, etc. Não foi minha intenção ser professoral em nenhum momento. Soa chato e arrogante. Apenas quis tornar a ambientação crível. Também procurei ler bastante sobre folclore, e não tem como fugir de Câmara Cascudo, que é a maior referência do assunto. Antes de começar a escrever passei mais de um ano lendo até sentir que já era capaz de ambientar o Danação, fazer o leitor se transportar no tempo. Espero ter conseguido.

7 – Tem alguma recomendação para os leitores do Policial da Biblioteca?
Leiam muito, e livros de qualidade. Um bom blog como o Policial serve como um guia e faz com que o leitor saiba de antemão um pouco sobre o livro. Assim, quando escolhemos uma leitura, já é possível ter uma ideia da qualidade. Em tempos de internet, é raro ver pessoas, principalmente jovens, que desgrudam do computador para se dedicar a um bom livro. Ler faz de qualquer um uma pessoa melhor.

Quero agradecer ao Marcus por enviar um exemplar e me proporcionar essa ótima leitura! Aguardando ansiosamente a continuação da história de Diogo!

E pra quem mora em Porto Alegre, uma ótima notícia! Foi confirmada a presença do Marcus na 58º Feira do Livro que vai acontecer no dia 4 de novembro. Lá ele vai falar sobre o Danação e litfan em geral. Eu gostaria muuuito de estar presente. Caso você possa, não perca essa oportunidade!


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Gostou? Não gostou? Comente! Sua opinião é sempre bem-vinda ;D